Especialistas ouvidos pela Reuters avaliam que,
confirmadas as informações reveladas pelo jornal Folha de S.Paulo, a campanha de Jair Bolsonaro pode
ser acusada de abuso de
poder econômico, abuso
do uso de meios de comunicação e omissão de doações de campanha,
o que poderia levar à impugnação
da chapa, mesmo que Bolsonaro não
soubesse da ação de empresários a seu favor.
"Se confirmada, a prática pode configurar abuso de poder
econômico, levando à inelegibilidade nessa própria eleição. A jurisprudência
diz que, mesmo que não tenha sido ele ou a campanha, a candidatura pode
responder pelo ilícito", disse Daniel
Falcão, coordenador do curso de pós-graduação em Direito Eleitoral do Instituto Brasiliense
de Direito Público.
O advogado especialista em legislação eleitoral Francisco Emerencianoacrescenta
que o caso pode ainda configurar omissão de despesas, o popular caixa 2,
além do abuso de poder econômico, se as acusações forem verdadeiras.
"Em se configurando isso, no mínimo, se houver o
conhecimento prévio da campanha --e não tem como o beneficiário não ficar
sabendo em valores como esse-- eu poderia ter um questionamento de que houve
omissão de despesa de campanha", disse Emerenciano.
Segundo reportagem publicada nesta quinta pela Folha,
empresários têm bancado a compra de distribuição de mensagens contra o PT por WhatsApp,
em uma prática que se chama pacote de disparos em massa de mensagens, e
estariam preparando uma ação para a próxima semana, antes do segundo turno.
O jornal relata que cada pacote de disparos em massa custaria
cerca de 12 milhões de reais,
para o envio de centenas
de milhões de mensagens. Ao menos quatro empresas podem ter
usado essa prática, segundo a reportagem.
Quatro especialistas ouvidos pela Reuters concordam que, em
tese, mesmo a campanha alegando que não tem relação com a decisão de
empresários que agiram em prol de Bolsonaro,
o candidato poderá ser responsabilizado por crime eleitoral, já que o resultado
da eleição pode ser alterado por ações em seu benefício.
"A responsabilização é objetiva. Não está sendo avaliado a
conduta pessoal de Bolsonaro.
A responsabilidade do abuso de poder é objetiva, não importa se a campanha agiu
com culpa (sem intenção) ou dolo (propositalmente). Vai ser avaliado se conduta
teve ou não influência na campanha", diz Guilherme
Salles Gonçalves, especialista em Direito Eleitoral e
membro fundador da Academia
Brasileira de Direito Eleitoral e Político.
Os advogados explicam que a suposta ação de empresários a favor
do candidato do PSL infringe diversos pontos da lei eleitoral. Se a ação foi
feita pelas empresas, configura doação ilegal, já que uma decisão do Supremo
Tribunal Federal proibiu empresas de doarem a partidos, campanhas ou candidatos
a qualquer tempo, não apenas em período eleitoral.
Se tiverem sido feitas em nome dos empresários, as doações não
apenas tem limites que podem ter sido ultrapassados, como teriam sido feitas
por meio do pagamento de serviço de terceiros, o que também é proibido.
A ação ainda infringe outra norma, a de que o impulsionamento de
propagandas em mídias sociais só pode ser feito pelo candidato, a campanha ou a
coligação e deve ser identificado como propaganda. Apoiadores ou eleitores são
proibidos de agir em benefício de seu candidato."É um caso clássico de
caixa 2 duplamente qualificado. Primeiro é um caso de gasto a favor da
candidatura vindo fora do orçamento da campanha. Depois, é feito por fonte
vedada. A decisão do Supremo
Tribunal Federal proibiu doação de empresa a partidos e
candidatos em qualquer momento, sobretudo em campanha eleitoral", explicou
Guilherme Salles Gonçalves. "A punição não tem gradação. Ou caça ou não
pune."
No início da tarde, sem mencionar a reportagem da Folha, Bolsonaro afirmou
no Twitter que
"apoio voluntário é algo que o PT desconhece e não aceita".