terça-feira, 29 de maio de 2012

“Eu não deveria ter de volta o meu mandato?”, pergunta Fernando Collor em entrevista

Vinte anos após deixar a Presidência da República por suspeita de corrupção, o hoje senador por Alagoas Fernando Collor de Mello (PTB) concedeu uma entrevista à Record News em que fala abertamente sobre o assunto. Ele diz que o poder “subiu à cabeça” de seu então tesoureiro Paulo César Farias, o PC Farias; admite que ficou “arrogante” no poder e que perdeu o mandato porque ignorou o Congresso Nacional. Inocentado pelo STF (Supremo Tribunal Federal) em 1994, ele questiona: “Eu não deveria ter de volta o meu mandato? É uma questão. É uma pergunta a ser respondida”.


Assista à entrevista completa:




Acusado pelo crime de corrupção passiva, Collor renunciou ao mandato, mas o Congresso ignorou seu pedido e votou pelo impeachment, o que lhe custou os direitos políticos. Dois anos após seu afastamento, em 1994, O STF (Supremo Tribunal Federal) arquivou o processo contra ele “por falta de provas”. Para Collor, sua recondução à cadeira presidencial é uma questão a ser debatida no Brasil.
— Do afastamento ao julgamento foram dois anos em que minha vida foi investigada de cima a baixo. [...] O STF me inocentou de todas as acusações que me foram feitas. Aí vem uma pergunta: se eu perdi o meu mandato com base na suposição de que as denúncias que me faziam eram verdadeiras, onde está o meu mandato que eu perdi quando a mais alta corte de Justiça do País decidiu que aquelas acusações eram falsas? Eu não deveria ter de volta o meu mandato? É uma questão. É uma pergunta a ser respondida.
Relembrando os momentos que antecederam sua queda, Collor admite um erro crucial no auge da crise. Em um discurso para taxistas no Palácio do Planalto, ele pediu que os brasileiros saíssem às ruas em sua defesa vestindo verde e amarelo.
— Na reunião com taxistas [...] eu disse que não iria falar. Terminou o evento e os taxistas começaram a gritar "fala Collor, fala". Eu me senti estimulado a falar, voltei e falei. E foi quando eu pedi – um erro de avaliação – que no domingo seguinte todos saíssem às ruas de verde e amarelo para mostrar que a democracia no Brasil era maior do que qualquer tentativa de golpe contra o primeiro presidente eleito pelo voto direto depois de 30 anos. E minha solicitação não foi atendida; todos saíram às ruas vestidos de preto.
Collor admitiu que a “arrogância” o fez ignorar o Congresso Nacional e que foi essa falta de apoio a verdadeira razão para sua queda.
— O que na realidade causou a minha saída da presidência da forma como se deu foi a falta de sustentação política no Congresso Nacional. Embora sendo de uma família uma parte política outra parte de diplomatas... Mas na questão política eu não havia aprendido uma coisa: que era o respeito e atenção que o chefe do Poder Executivo deve ter com o Poder Legislativo.
Ele afirmou que essa não havia sido a primeira vez em que ignorou o Legislativo, mas que já havia feito o mesmo quando foi prefeito de Maceió e governador de Alagoas.
— Não dei a atenção devida. [...] Saí do governo [estadual], me elegi presidente e aquilo foi sedimentando em mim algo nocivo. A arrogância também [...] um certo sentimento de superioridade em relação aos seus semelhantes, que é um erro terrível ao qual eu me penitencio sempre.
Veja X IstoÉ
Collor também nega que a revista Veja o tenha derrubado, apesar da publicação de uma entrevista com Pedro Collor de Mello, em que ele (morto em 1994) acusa o próprio irmão.
— [A revista Veja] acha que foi ela quem causou [meu afastamento], mas não foi, foi a revista IstoÉ. [Foi com a matéria] em que apareceu um motorista que estava lotado no Palácio do Planalto fazendo trabalhos para a minha secretária. Eu não o conhecia, mas foi essa matéria que foi a pedra de toque que levou ao meu afastamento, que mobilizou o Congresso e a população.
Lula e PC Farias
— Subiu à cabeça.
Foi assim que Collor se referiu a PC Farias — também inocentado pelo crime de corrupção passiva — sem o qual “não haveria campanha presidencial”.
— Diferentemente do que pintam dele, ele era uma pessoa extremamente cordata, correta, amiga. Teve um momento em que nos afastamos, quando eu tive algumas comprovações de que ele tinha se deixado levar pela notoriedade que havia ganho, mas o fato é que desde o início acreditou no projeto político.
PC – que foi encontrado morto ao lado da namorada Suzana Marcolino em 1996 – e Collor estreitaram relações quando ele ainda governava Alagoas.
— Eu procurei o Paulo César, contei do projeto que eu tinha e se ele poderia me ajudar. Ele disse "acredito porque conheço você, que é determinado, e a linha que o Brasil necessita é essa". Ele foi para São Paulo, Rio e Minas e fez os contatos para que tivéssemos uma estrutura mínima de campanha. No segundo turno, a situação mudou porque já havia uma notória divisão de forças, Collor versos Lula.
De acordo com o senador, a eleição em que ele venceu Luiz Inácio Lula da Silva foi a “a última disputa presidencial em que houve uma nítida diferença de programas entre um candidato e outro”.
— Foi no segundo turno de 1989, em que o Lula pregava a presença do Estado, não à privatização e abertura comercial; e eu do lado oposto. Quando a população decidiu pelo meu nome, ela decidiu a favor de um programa de governo. Depois desta eleição, vamos verificar que, em todas elas, a diferença de discurso dos candidatos se estreitou.
Collor conclui a entrevista lembrando que foi eleito presidente da República muito novo, "aos 40 anos e sete meses..."


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