terça-feira, 5 de fevereiro de 2013

A VERDADE SOBRE O CAOS FINANCEIRO DE ILHÉUS

J. A. – Mas nesse tempo o senhor retorna à Prefeitura. Qual foi a situação encontrada?

A. O. – Exato. Quando retornei, 13 anos depois, Ilhéus já devia US$ 75 milhões às empreiteiras e a Prefeitura era a maior devedora da Previdência, dentre as maiores prefeituras do interior do Brasil – fora as capitais e as cidades das regiões metropolitanas. O mais grave, porém, é que ao longo de 20 anos não foram realizadas obras de grande porte, e sim algumas sem significativa importância. Ao lado desse descalabro, dos 1.600 funcionários que deixei no meu primeiro mandato, encontrei 4.600, sendo que 3 mil a mais e contratados sem concurso, via CLT. Irresponsabilidade maior ainda foi cometida, pois não pagaram [os dois prefeitos] as obrigações sociais de ordem previdenciária e trabalhista, provocando um endividamento monstruoso.


Com grande parte da receita comprometida para o pagamento de precatórios trabalhistas e civis, dívidas com INSS, FGTS e empréstimos, não sobra dinheiro para o Município de Ilhéus investir em obras e serviços que possam proporcionar melhor qualidade de vida à população. Para o advogado Antônio OlímpioRhem da Silva (AO), atual presidente da Maramata, prefeito por dois mandatos e deputado estadual, Ilhéus foi altamente prejudicado pela falta de competência e compromisso de alguns ex-gestores. Nesta entrevista concedida ao AGORA, AO (foto) conta como o município chegou ao estágio atual e diz que Ilhéus tem jeito, e alerta que para o Município volte à condição de maior polo regional econômico e político, é preciso eleger candidatos sérios e comprometidos com Ilhéus, banindo os falsos milagreiros e os “Mandrakes”. A seguir, principais trechos da entrevista:

Jornal Agora – Com sua experiência de dois mandatos, quais os principais problemas que transformaram o município de Ilhéus num devedor, a ponto de inviabilizar sua capacidade de investimentos?

Antônio Olímpio – Ilhéus se afundou em dívidas pelos erros seguidos de administradores municipais despreparados, oportunistas ou que simplesmente usaram o poder para partilhar as benesses com a família e com amigos, além da queda brusca de arrecadação. Esse mal não foi causado somente nas finanças, mas, sobretudo, no prestígio que sempre teve, em ser uma cidade de vanguarda e sede de empresas e instituições importantes a exemplo da Embasa, Coelba, Petrobras, Brasilgás, moinho de trigo, além de eventos conceituados.

J. A. – Quando começou essa série de más administrações em Ilhéus?

A. O. – Essas dívidas surgiram há cerca de 28 anos, mas para que todos compreendam bem, é preciso retroceder a narração dos fatos ao início de nossa gestão, em 1977. Nesta época, Ilhéus era um município que desfrutava de uma excelente receita, na sua maioria proveniente da produção de cacau, e que foi ampliada com o advento do porto, a implantação do distrito industrial, responsável por cerca de 70% de todo o ICMS arrecadado. Quando assumi a administração do município em 1977, fiz um levantamento com a equipe da prefeitura e mais dois técnicos contratos, sobre a comercialização e exportação de cacau e, de acordo com os dados levantados, Ilhéus estava altamente prejudicada com o retorno do ICMS. Levamos o demonstrativo ao governador do Estado, Roberto Santos, que sensível ao problema, autorizou a Secretaria da Fazenda verificar a distorção e corrigir os índices. Com isso, do sétimo lugar que ocupávamos, passamos a quarto maior município arrecadador.

Jornal Agora – E esses recursos não davam para investir e pagar o custeio da máquina?

A. O. – Pois bem, à época, com essa arrecadação, Ilhéus tinha pouco mais de 900 funcionários, quase todos em regime estatutário, o que não gerava obrigações externas com a Previdência Social (INSS), FGTS, PIS/Pasep. No nosso primeiro governo – passei cinco anos e renunciei um ano antes de encerrar o mandato para me candidatar à Assembleia Legislativa – deixei o município bem estruturado, sem dívidas, à exceção dos recursos que foram contratados para o Projeto Cura, aplicado no bairro do Malhado, no valor de 596 mil UPC’s, dos quais gastei apenas 296 mil UPC’s, deixando 300 mil UPC’s à disposição do Município, que segundo Jabes Ribeiro, foram utilizados no programa Viva o Morro. Essa era a única dívida do município a ser paga em 20 anos, mesmo assim não era impeditiva de novos investimentos, em função do período de carência.

Então, àquela época deixei a Prefeitura com cerca de 1.600 funcionários, desses, cerca de 600 em regime de CLT e os outros 900 estatutários, e com todas as obrigações previdenciárias e trabalhistas religiosamente quitadas.

J. A. – O que ocorreu a partir daí?

A. O. Os sucessivos governos de Ilhéus exageraram no endividamento, com uma série de obras contratadas através da captação de recursos. Como a capacidade de endividamento era enorme, foram tomando empréstimos sem planejamento e desestruturaram as finanças do município, deixando de recolher a contribuição da Previdência e o do FGTS. Entretanto, a irresponsabilidade era tamanha, que essas obras foram contratadas a pequenas empreiteiras, sem obedecer à exigência da comprovação do pagamento dessas obrigações, ficando também responsável por todas essas irregularidades, o que aumentou estratosfericamente o débito com o então INPS e a dívida da Prefeitura foi se transformando numa bola de neve.

J. A. – Mas nesse tempo o senhor retorna à Prefeitura. Qual foi a situação encontrada?

A. O. – Exato. Quando retornei, 13 anos depois, Ilhéus já devia US$ 75 milhões às empreiteiras e a Prefeitura era a maior devedora da Previdência, dentre as maiores prefeituras do interior do Brasil – fora as capitais e as cidades das regiões metropolitanas. O mais grave, porém, é que ao longo de 20 anos não foram realizadas obras de grande porte, e sim algumas sem significativa importância. Ao lado desse descalabro, dos 1.600 funcionários que deixei no meu primeiro mandato, encontrei 4.600, sendo que 3 mil a mais e contratados sem concurso, via CLT. Irresponsabilidade maior ainda foi cometida, pois não pagaram [os dois prefeitos] as obrigações sociais de ordem previdenciária e trabalhista, provocando um endividamento monstruoso.

J. A. – Daí é que decorre essa dívida imensa?

A. O. – Como se essas atrocidades não bastassem, ao lado disso, depois das eleições municipais de 1992, quando ganhei o pleito para Jabes, o município concedeu, indiscriminadamente, a estabilidade financeira a todo o pessoal celetista, com base numa lei municipal existente e que atingia apenas o estatutário, o que gerou uma série de reclamações trabalhistas, porque ao detectar o erro suspendi o pagamento. A Justiça deu ganho de causa aos servidores celetistas e recorremos das sentenças até o TST, quando se transformaram em precatórios.

J. A. – Eis a origem dos temidos precatórios…

A. O. – Pois é. Ao lado dessa falta de controle administrativo, João Lyrio, no primeiro mês de governo, colocou em prática um Plano de Cargos e Salários elaborado e aprovado de forma irresponsável. A distorção era tamanha que depois de pagar o primeiro mês, mandou suspender o pagamento sob a alegação de que o município não aguentava aquela carga. Porém, quatro anos depois, no final do seu mandato, mandou fazer o cálculo da diferença do seu subsídio, num montante de cerca de 56 mil, em moeda da época, e autorizou o seu próprio pagamento. Ora, se o próprio gestor agiu dessa maneira, todos os detentores de cargos de confiança que se encontravam numa situação semelhantes a sua, procuraram um renomado advogado trabalhista, João Batista Soares Lopes, e ingressaram com reclamações trabalhistas. Conseguiu ganhar todas, que resultou na grande parte dos precatórios trabalhista, endividando ainda mais o município.

J. A. – As consequências disso são sentidas até hoje…

A. O – E serão por muitos mais tempo. São essas irresponsabilidades que têm atormentado administrações municipais posteriores, criando dificuldades enormes para administrar o município, como o excesso de funcionários e a falta de pagamento das obrigações sociais, as dívidas contraídas em volume exagerado e sem necessidade e a má utilização do dinheiro público em benefício próprio, como foram os casos citados.

J. A. – Existe uma fórmula para sair desse “buraco negro”?

A. O. – A situação tem se tornado bem mais complexa. Hoje o município está caminhando para arrecadar ainda menos, devido à centralização dos recursos nos governos federal e estadual, reduzindo ainda mais a capacidade de investimentos. Cabe à atual e às futuras administrações promoverem um diagnóstico completo da situação e reestruturar toda a máquina arrecadadora, e recuperar os índices da arrecadação de ICMS, além de ampliar os tributos do município, a exemplo do IPTU e ISS, que geralmente não são pagos por grande parcela da população.

Acredito que quem vai governar Ilhéus no futuro terá um grande desgaste se não souber explicar à população os motivos desse endividamento e as medidas que devem ser tomadas para que a cidade possa se tornar governável, pois hoje a situação é extremamente difícil e faltam recursos até para a manutenção da cidade, como tapar buracos de ruas e fazer pagamentos dos percentuais pactuados na Justiça para honrar precatórios e outros tipos de acordos judiciais, além de pequenas obras.

J. A. – Como os políticos, deputados e vereadores podem contribuir nesse processo?

A. O. – Quem vai governar precisa de uma boa de base deputados federais e estaduais, bem como de vereadores, mas temos de saber em quem estamos votando, pois o vereador não é só para dar nome à rua, votar moções de pesar, indicações e conferir título de cidadão até para quem merece. Temos que votar em vereador que saiba legislar, apresentar projetos importantes para o desenvolvimento da cidade, fiscalizar o Executivo através da execução do orçamento, apresentar emendas compatíveis com a necessidade do município, para que as obrigações de governar sejam compartilhadas e não se queira cobrar milagres do prefeito. O prefeito vai governar de acordo com o que tem de finanças, de obrigações e de acordo com o orçamento.

J. A. – Então, na sua opinião, Ilhéus tem jeito?

A. O. – As perspectivas para Ilhéus são as melhores possíveis, caso sejam implantados, como acredito, o Complexo Intermodal do Porto Sul, com o porto, aeroporto e ferrovia; a Zona de Processamento e Exportação (ZPE); dentre outros projetos. A cidade vai crescer e é evidente que teremos que formatar um novo plano diretor urbano, no sentido de ordenar, disciplinar o crescimento, solucionando os problemas atuais, contratando técnicos competentes para participar do planejamento da cidade.

J. A. – As eleições estão chegando. Teremos aí uma boa chance de ver essas soluções que o senhor aponta sendo postas em prática, como teremos o risco de repetir os erros recentes. Existe receita para o eleitor seguir nas eleições de 2012?

A. O. – Ah, temos que enfrentar a realidade e nas próximas eleições eleger pessoas dignas e sérias. Se um candidato está envolvido com desvio de conduta, do ponto de vista de honestidade, não vai ser comandando os recursos públicos que ele irá se regenerar, pelo contrário, vai meter ainda mais a mão nos recursos públicos. O desonesto não pode governar, o oportunista vai querer usar os recursos para promoção pessoal, sem contar que ainda tem o falso milagreiro, o Mandrake, que promete resolver todos os problemas da cidade com uma varinha mágica.

Atualmente, os problemas de Ilhéus só podem ser resolvidos com absoluta seriedade, competência e com uma boa equipe de técnicos. Para isso, o dirigente tem de ter altivez, autonomia e autoridade para escolher colaboradores de qualidade e não aceitar imposições de partidos aliados. Claro que tem que compor o governo, mas que apresentem pessoas competentes.

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Os comentários são de responsabilidade dos autores e não representam a opinião do JORNAL ILHÉUS NEWS. É vetada a postagem de conteúdos que violem a lei e/ ou direitos de terceiros. Comentários postados que não respeitem os critérios podem ser removidos sem prévia notificação.